A Função Emotiva




Roman Jakobson
elabora, no texto "Lingüística e Poética", faz um quadro dos fatores constitutivos de todo processo comunicativo, e relaciona a cada um deles a uma das funções da linguagem. Como meu objetivo aqui não é examinar todas as funções, mas verificar apenas uma delas no cinema, reproduzo aqui somente o quadro, sem falar de cada uma:

CONTEXO
(REFERENCIAL)

REMETENTE..................MENSAGEM..................DESTINATÁRIO
(EMOTIVA)....................(POÉTICA)...................(CONATIVA)

CONTATO
(FÁTICA)

CÓDIGO
(METALINGÜÍSTICA)

Eu estudo realmente a função poética, centrada na mensagem, principalmente no modo como ela se opõe à função referencial, centrada no contexto, mas quero falar aqui sobre a função emotiva, que tem como foco o remetente.

A função emotiva, ou "expressiva", visa a expressão direta da atitude de quem fala em relação àquilo que está falando. Tende a suscitar a impressão de uma certa emoção, verdadeira ou simulada.
Essa função, claro, não se limita à linguagem verbal, e, acredito, pode ser facilmente percebida no cinema, por exemplo, que é essencialmente linguagem visual.
No cinema, determinada cena deve passar determinada emoção ao espectador, de forma que este não apenas saiba qual a emoção que o diretor (o autor, seja ele quem for) quer passar, mas que ele realmente sinta a mesma emoção ao ver a cena.

Seria muito fácil usar aqui cenas dramáticas, com muito choro e muita tragédia, ou o oposto disso, uma cena alegre, divertida, com muitos sorrisos, para passar um sentimento de tristeza ou alegria, respectivamente. Não vou fazer isso. Prefiro escolher um sentimento que não tem nome, algo que não é muito comum, pelo menos não nas discussões do dia-a-dia, mas que, acredito, todo mundo já sentiu.
Para diminuir o risco de que meu leitor não sinta a mesma coisa que eu, e a mesma coisa que, acredito, o diretor tentou passar com a cena, vou reproduzir aqui duas cenas, de dois filmes bastante diferentes, mas que transmitem, pelo menos a mim, a mesma sensação, o mesmo sentimento.
A primeira cena é do filme Antes do Pôr-do-Sol (Before Sunset, 2004), de Richard Linklater, e a segunda é de Memórias (Stardust Memories, 1980), de Woody Allen.






Não quero me deter em explicar o tipo de sentimento que se passa aqui, não pretendo mesmo pôr em palavras. Prefiro que o leitor julgue por si só se o sentimento é o mesmo.

A diferença que percebo entre as cenas, embora elas me passem a mesma sensação, é que uma se fundamenta mais nas palavras, na descrição do sentimento, mesmo que este seja fortemente ampliado pelas imagens e pela música, enquanto a outra se fundamenta unicamente nas imagens e na música, mas tendo o sentimento ampliado pelo contexto em que se dá a cena, que, infelizmente, não posso reproduzir aqui (seria necessário ver o filme inteiro, além do filme anterior, Antes do Amanhecer - Before Sunrise, 1995).
Não sei se existe uma relação entre o smoth jazz e esse sentimento, mas sei que ambas as músicas são nesse estilo.
Acho as duas cenas tão parecidas que acredito mesmo que a descrição contida na narração do filme de Woody Allen, mutatis mutandis, vale para a cena de Richard Linklater.

"Foi um desses ótimos dias de primavera. Era domingo e era possível sentir que o verão estava chegando. Eu lembro que naquela manhã eu e Dorrie tínhamos caminhado no parque. Voltamos ao apartamento. Ficamos só lá sentados. Eu coloquei um disco de Louis Armstrong, uma música que eu cresci amando. Foi muito bonito. Eu olhei ao redor e vi Dorrie lá sentada. E lembro que pensei no quanto ela era maravilhosa, e no quanto eu a amava. E acho que foi a combinação de tudo. O som da música e a brisa, e como Dorrie estava linda. E por um breve momento, tudo pareceu se encaixar perfeitamente. E eu me senti feliz, de uma forma quase indestrutível. É engraçado. Aquele simples momento de contato, me tocou de uma forma muito profunda."

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Filmes:
Memórias (Stardust Memories, 1980) - Woody Allen
Antes do Pôr-do-Sol (Before Sunset, 2004) - Richard Linklater

Livros:
Lingüística e Comunicação - Roman Jakobson