A pele de Diane Arbus




O filme A Pele (Fur: An Imaginary Portrait of Diane Arbus, 2006) não é uma biografia da fotógrafa americana Diane Arbus. É, como propõe o título, um retrato imaginário. Vemos, durante o filme, que Diane (Nicole Kidman) se interessa pelo grotesco, pelo anormal, e vê nisso uma certa beleza. Essa beleza do grotesco é vista nas suas fotografias, na obra da artista real. A mente de Diane no filme é conturbada, e isso parece ser um comentário sobre a mente da artista, como se ela precisasse expor sua estranheza através da arte. A personagem revela essa estranheza através da personalidade, e procura, através de estranhos que possuem uma "aberração" externa, revelar a sua, que é interna.









(Lionel - Imagem de A Pele)


No começo do filme, a personagem tenta negar sua "aberração" interior, diz não querer ser como é. Mas, depois de entrar em contato com um vizinho, Lionel (Robert Downey Jr.), ela parece cada vez mais abraçar essa sua anormalidade interna. Algo que se revela na fotografia de Diane Arbus se reflete no filme: a personagem Diane parece procurar o estranho por se sentir estranha. Por isso o filme se presta como um retrato "imaginário", pois procura, através da arte de Diane, reconstruir sua pessoa, sua personalidade, como se fosse um retrato interior, da sua alma, e não do seu corpo, da sua vida. Nesse sentido, a pele, o nudismo, assume outro sentido, como se o nu fosse uma aproximação maior com a alma.















(Young girl nudist - 1965)












(Imagem de A Pele)



Expor a pele dos outros, expor as aberrações dos outros, através da fotografia, seria, dentro da idéia geral do filme, um desejo por parte de Diane de expor a si mesma, de expor sua própria aberração, esta que não pode ser vista, nem mesmo em nu. No filme, ela não se sente confortável em ser fotografada, ela prefere se revelar através das fotos que tira, e não através de sua própria imagem.

O relacionamento dela com Lionel, personagem inventada para o filme, assemelha-se a uma busca interior, uma tentativa de se encontrar, de aceitar o estranho nela mesma. A aceitação do seu lado aberração ocorre quando ela faz amor com Lionel, algo que revela o seu amor por esse lado grotesco que existe nela. O fato de Lionel se matar no final do filme tanto significa uma assimilação por parte dela desse seu lado aberração, quanto se mostra uma metáfora (algo metonímia), que, agindo como um foreshadowing, espelha seu próprio suicídio, o suicídio da fotógrafa, em 1971.

Quanto a essa questão (a concretização da personalidade de Diane na tela), o filme se mostra perfeito. No entanto, poderia assimilar melhor as qualidades da obra da fotógrafa real. O filme poderia, por exemplo, ser em preto e branco, naquele tom de prata que ela costumava usar em suas fotos. Da mesma forma que a fotografia de Diane Arbus é mais conhecida por sua temática, e não por quaisquer outras razões artísticas, o filme recupera somente essa parte da sua arte: os temas. Seria necessária uma fotografia mais fiel à obra de Diane, para que o filme conseguisse uma perfeição estética tão grande quanto conseguiu na construção da personagem. Algo importante também para isso, além do tom de prata, seria o olhar para a câmera, tão raro no filme quanto o preto e branco.








(Imagem de A Pele)










(Imagem de A Pele)



Basta que se compare a forma como os temas são tratados no filme e nas fotos de Diane Arbus: não há semelhança outra, que não o tema. A que mais se aproxima, é a imagem das irmãs gêmeas, talvez a foto mais conhecida de Diane.














(Hermaphrodite and dog in carnival - 1970)











(Imagem de A Pele)

















(Jewish giant at home with his parents - 1970)











(Imagem de A Pele)


















(Identical twins - 1967)










(Imagem de A Pele)




Mesmo assim, me parece que Kubrick fez um trabalho melhor de "homenagem" a Diane Arbus em uma rápida, mas memorável, imagem de O Iluminado.












(Imagem de O Iluminado)



A fotografia de Diane Arbus merecia um filme com imagens tão belas e de sentido tão inalcançável quanto ela mesma ("ela mesma" aqui significa tanto a própria Diane quanto sua fotografia).
















(Tattooed man at a carnival - 1970)
















(Naked man being a woman - 1968)

















(child with toy hand grenade in central park - 1962)





“A photograph is a secret about a secret.
The more it tells you the less you know.”
("Uma fotografia é um segredo sobre um segredo.
Quanto mais ele conta, menos você sabe.")
Diane Arbus

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