Eisenstein + Tarkovsky: tudo é montagem





Eisenstein via montagem em tudo. Não acho que a montagem seja a coisa mais importante num filme, entendo que há outras coisas tão importantes quanto ela, mas não sei se Eisenstein estava errado em ver montagem em todas as coisas. Montagem, para ele, era feita com oposições, com conflito entre duas imagens.

Fora do cinema, ele via montagem, por exemplo, em dois hieróglifos com sentido concreto que se juntam para formar um conceito abstrato, um ideograma:

"A questão é que a cópula (...) de dois hieróglifos da série mais simples não deve ser considerada como uma soma deles e sim como seu produto (...), cada um deles, separadamente, corresponde a um objeto, (...), mas sua combinação corresponde a um conceito."

Isso, para Eisenstein, era montagem. O mesmo ocorria, para ele, na literatura, por exemplo, nos haicais. Ele cita vários exemplos de haicais, entre eles, esse de Bashô:

"Um corvo solitário
sobre um galho sem folhas,
uma noite de outono."

E diz:

"Do nosso ponto de vista, estas são frases de montagem."

Ainda há exemplos de montagem em desenho, e em um enquadramento único (composição).

Pensando sobre Tarkovsky (não por coincidência, também russo), lembrei de cenas em que ele não usava cortes, mas fazia montagem. Seria um ótimo argumento para Eisenstein: demonstrar que mesmo sem cortes pode haver montagem.



Nesse clipe de "O espelho", Tarkovsky faz montagem sem um corte sequer. Note como a câmera não acompanha as crianças saindo da mesa, mas termina por chegar a outro ponto em que elas já estão. Em uma montagem comum haveria um corte na saída das crianças, e a próxima imagem seria já das crianças entrando, de costas, na outra sala.

Não quero examinar aqui se se trata de montagem sem conflito ou não, quero somente destacar que se trata de montagem sem cortes, coisa que é comum no cinema de Tarkovsky, e que ele realizou com mestria.

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referências:
EISENSTEIN, Sergei. (2000) "O princípio cinematográfico e o ideograma". In: CAMPOS, H. (org.) Ideograma: lógica, poesia, linguagem. 4ed. São Paulo: Edusp.

filmes:
Zerkalo (O espelho), 1975. (dir: Andrei Tarkovsky)
(clipe retirado do youtube)

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Eisenstein na wikipedia: em inglês; em português.
Eisenstein no imdb: em inglês.
Tarkovsky na wikipedia: em inglês; em português.
Tarkovsky no imdb: em inglês.
"O espelho" no imdb: em inglês.

3 comentários:

Anônimo disse...
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Anônimo disse...

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Anônimo disse...

Meu Deus do céu...
nem saquei o que é montagem ou não, se é de comer ou se isso é ruim,,, sei que tu achou uma cena que dá muitas análises... a base nela são as oposições... há conflito...
luz ao fundo, ao longe, bem longe,,, benéfica e há essa luz, bem perto, bem perto, maléfica.
Fogo fundindo a fundo.

Há oposiçao e conflito no olhar das crianças... interessante notar que pra cada lado que a câmera aponta há labirintos
vários lugares diferentes, até partir pra o foco principal, o fogo.
Analisar a simbologia do fogo também é interessante.

Vou te dizer... parece engraçado...
mas não é nada legal um fogo básico num paiól....
eita coisinha que incomoda é um fogo no lugar errado.
:)